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Empresa “aluga” precatório para garantir execução fiscal

Uma empresa da área de alimentos encontrou uma alternativa diferente, especialmente em tempos de crise, para garantir uma execução fiscal. A empresa optou por alugar um precatório para apresentar à Justiça como garantia de pagamento da execução fiscal, caso perca o recurso que apresentou ao Judiciário. “A minha cliente não tinha bens para dar como garantia e estava sofrendo com a ameaça de penhora on-line das suas contas”, diz o advogado Gustavo Viseu, do escritório Viseu, Cunha e Oricchio Advogados. “Diante disso, idealizamos esse tipo de operação”, conta.

Com uma dívida de R$ 3,5 milhões do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do estado de São Paulo, que está sendo questionada na Justiça, a empresa só tinha três opções para que a sua contestação fosse analisada pelo Judiciário: depositar o valor questionado integralmente, apresentar bens para penhora em valor igual ou superior ao suposto débito ou entregar uma carta fiança. “Como a empresa não tinha bens neste valor e não tinha o dinheiro, tivemos que buscar uma alternativa para garantir a sua defesa”, diz Viseu.

Num primeiro momento, veio a ideia de comprar o precatório, que normalmente é vendido com deságio de até 70%. Apesar do desconto, a proposta esbarrou na falta de dinheiro da companhia. Em seguida veio a proposta de emprestar, mediante o pagamento de uma comissão, um precatório. “Como temos outro cliente que tem um precatório alimentar do estado de São Paulo, sugerimos que ele oferecesse o seu título para garantir a dívida do outro cliente”, explica.

Viseu comenta que o Código de Processo Civil admite que um terceiro ofereça bens para penhora para garantir a execução. Diante disso, as partes assinaram um contrato extrajudicialmente determinando as regras do acordo. O contrato particular prevê que o locatário pagará 2% ao ano a título de aluguel. “O contrato prevê uma cláusula para cada situação”, diz Viseu que representa tanto a empresa locatária quanto o locador do precatório. As situações possíveis são: a empresa ganhar o processo e o precatório voltar para o seu dono; ou a empresa perder o recurso. Neste caso, ela pode pagar e encerrar o processo, pode fazer depósito em dinheiro e recorrer ou a empresa não fazer nada e o precatório ir a leilão. Caso a decisão judicial seja desfavorável à empresa e o precatório perdido, ela pagará ao locador 40% do valor do título. Atualmente, o deságio na compra de precatório pode chegar a até 70%.

Com faturamento mensal que varia entre R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões, o advogado conta que sua cliente não conseguiria ter seu direito de recurso garantido sem o aluguel do precatório. No processo judicial, as partes optaram por não colocar que se tratava de uma locação. “O CPC admite bens de terceiro para garantir a execução e o credor tem a prerrogativa de aceitar ou não a garantia, mas o juiz pode fazer valer a garantia apresentada”, diz o advogado.

A criatividade da operação foi vista com bons olhos pelo advogado Luiz Rogério Sawaya Batista, do escritório Nunes, Sawaya, Nusman & Thevenard Advogados. “Se o terceiro aceita garantir a execução com o seu precatório, é uma alternativa interessante”, diz o advogado. Para ele, a opção encontrada pelo colega pode ser mais atraente às empresas do que uma fiança bancária, por exemplo. “A fiança bancária é cara e com a crise o crédito está muito difícil”, afirma.

Sawaya conta que uma mudança na Constituição Federal em 2000 dá sustentação para o uso de precatórios para garantia de dívida fiscal. Segundo essa mudança constitucional, há a possibilidade de cessão por terceiros de precatórios para o pagamento de débito fiscal. “O precatório alimentar é mais aceito que o não alimentar, mas o ministro Eros Grau (do Supremo Tribunal Federal) disse que não faz diferença um precatório do outro e não vê problema em aceitar precatório não alimentar para débito fiscal”, comenta Sawaya.

Já o advogado Nelson Lacerda, do escritório Lacerda & Lacerda Advogados, diz que tal garantia pode ser muito arriscada tanto para o dono do título quanto para quem aluga. Para ele, o locador corre o risco de perder o precatório e depois não conseguir receber o valor total do título do comprador. “E se o locador agir de má-fé e der o mesmo título como garantia para outra execução, o locatário pode responder por litigância de má-fé”, alerta. Lacerda sugere aos seus clientes a compra do título, ainda que seja de forma parcelada. “O aluguel pode ficar mais caro do que comprar”, diz.

Gazeta Mercantil, 27/2/2009 – DIREITO CORPORATIVO, A11

Waldemar Jezler – www.libracap.net

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